Distinções entre as assinaturas digitais e as eletrônicas ainda são pouco conhecidas.
No cenário jurídico atual, a maneira como as assinaturas são tratadas e validadas tem se tornado cada vez mais relevante. Com a ascensão de plataformas especializadas em assinaturas eletrônicas e digitais, compreender a distinção e a aplicabilidade dos diferentes tipos de assinaturas é crucial. Este artigo se aprofunda nessa discussão.
A assinatura eletrônica é qualquer marca ou sinal eletrônico que uma pessoa utiliza para indicar sua aprovação ou consentimento em um documento eletrônico. Pode ser tão simples quanto um nome digitado, um clique em um botão de aceite ou uma imagem de uma assinatura manuscrita.
Tem valor legal e é aceita em muitas situações, mas pode ser menos segura que uma assinatura digital, pois não utiliza criptografia para verificar a autenticidade do signatário.
Já a assinatura digital utiliza criptografia assimétrica para garantir a integridade e autenticidade do documento e do signatário. Ela vincula de forma única o signatário ao documento. Geralmente, requer um certificado digital emitido por uma autoridade certificadora reconhecida.
Isso adiciona uma camada extra de segurança e torna a assinatura digital mais confiável e aceita legalmente em muitos contextos, especialmente em transações formais e documentos oficiais.
Portanto, enquanto a assinatura eletrônica é um termo mais amplo e pode se referir a qualquer tipo de assinatura feita eletronicamente, a assinatura digital é um subconjunto específico que oferece maior segurança e validade legal devido ao uso de tecnologias de criptografia.
A Covid-19 estimulou a ascensão das plataformas de assinaturas digitais e das eletrônicas. Com as medidas de distanciamento social e as restrições à mobilidade, houve necessidade urgente de alternativas para a realização de transações e a formalização de contratos que tradicionalmente exigiam presença física ou assinaturas manuscritas.
Plataformas passaram a oferecer soluções práticas e eficientes para este desafio, permitindo a continuidade dos negócios e a execução de procedimentos jurídicos de maneira remota. Além disso, a Lei nº 14.063/2020 e a Medida Provisória (MP) nº 2.200-2/2001 desempenharam papel crucial em legitimar o uso dessas tecnologias, proporcionando um marco legal para sua adoção num espectro mais amplo de atividades, incluindo interações com entidades governamentais e processos judiciais.
Categorias de assinaturas eletrônicas
A Lei nº 14.063, de 23 de setembro de 2020, é um marco importante nesse contexto. Ela estabelece regras para o uso de assinaturas eletrônicas em interações entre pessoas, instituições privadas e entes públicos. Essa lei classifica as assinaturas eletrônicas em três categorias: simples, avançada e qualificada.
A assinatura eletrônica simples é a mais básica, enquanto a avançada oferece maior segurança, não sendo emitida pela ICP-Brasil (Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira), mas devendo ser aceita pelas partes ou pela pessoa a quem for apresentado o documento. Já a assinatura eletrônica qualificada, que utiliza um certificado digital emitido pela ICP-Brasil, é considerada a mais segura e é obrigatória em situações específicas, como na emissão de notas fiscais eletrônicas e no registro de atos perante as juntas comerciais.
Paralelamente, a MP nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2001 instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), essencial para a validação das assinaturas digitais. A ICP-Brasil é responsável por garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos eletrônicos, bem como das transações eletrônicas realizadas com certificados digitais.
Esta MP foi fundamental para estabelecer um sistema robusto de segurança jurídica no ambiente digital brasileiro.
A ICP-Brasil é uma cadeia hierárquica de confiança que viabiliza a emissão de certificados digitais para identificação virtual do cidadão e de empresas. Já as autoridades certificadoras (ACs) são organizações responsáveis pela emissão, renovação e revogação de certificados digitais. Essas entidades podem ser de natureza pública ou privada.
É possível consultar a árvore hierárquica da ICP-Brasil, onde está a lista de todas as autoridades certificadoras de 1º e 2º níveis e autoridades de registro no site ICP – Brasil (iti.gov.br).
O modelo brasileiro é o de certificação com raiz única. Na ICP-Brasil, a AC-Raiz, que é a autoridade máxima da cadeia de certificação, é representada pelo Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI). Este órgão é responsável por implementar as políticas de certificados e seguir as normas técnicas e operacionais estabelecidas pelo comitê gestor da ICP-Brasil. O ITI é uma autarquia federal, vinculada à Casa Civil da Presidência da República, que tem por missão manter e executar as políticas da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira — ICP-Brasil. Ao ITI compete ainda ser a primeira autoridade da cadeia de certificação digital — AC Raiz.
O ITI, além de desempenhar o papel de autoridade certificadora raiz (AC-Raiz), credencia e descredencia os demais participantes da cadeia, supervisiona e audita os processos.
Certificado digital
Recentemente, um juiz questionou a validade de uma assinatura em um documento assinado via plataforma especializada, levantando dúvidas sobre o uso de certificado digital. Em sua decisão, o magistrado enfatizou a necessidade de regularização da representação processual e mencionou a ausência de um relatório de validação e certificação das assinaturas digitais. Este caso destaca a importância da compreensão da natureza e capacidade técnica das plataformas de assinatura por parte das cortes judiciais.
Existe uma percepção comum de que algumas plataformas apenas proporcionam assinaturas eletrônicas. No entanto, elas também permitem o uso de assinaturas digitais, desde que se utilize um certificado digital válido.
O avanço tecnológico trouxe novos desafios e oportunidades no âmbito jurídico. É crucial que os profissionais do direito e os tribunais estejam bem informados sobre as capacidades e limitações das ferramentas digitais modernas. Entender a legislação aplicável e as classificações de assinaturas eletrônicas é essencial para garantir a correta interpretação e aplicação da lei, assegurando a validade jurídica dos documentos eletrônicos.
A jurisprudência brasileira tem abordado casos variados envolvendo assinaturas digitais e eletrônicas, refletindo a evolução e os desafios dessa tecnologia no contexto jurídico. Por exemplo, em um caso, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) reconheceu a validade de uma assinatura digital em uma ação de execução de título extrajudicial, destacando que documentos eletrônicos são admissíveis por lei, desde que observada a legislação específica, e que assinaturas digitais não emitidas pelo ICP-Brasil podem ser válidas se admitidas pelas partes envolvidas.
Em outro caso, o TJ-SP lidou com a execução de título extrajudicial e exigiu que um acordo assinado digitalmente tivesse reconhecimento de firma ou certificação credenciada, visto que a plataforma utilizada não possuía certificação da autoridade brasileira.
O uso de assinaturas digitais e eletrônicas simplifica todo o processo de contratação de produtos e serviços, sendo relevante o entendimento aprofundado sobre suas aplicações e implicações legais. A legislação brasileira e a jurisprudência recente demonstram um esforço contínuo para incorporar e validar essas inovações tecnológicas, mantendo a segurança e a integridade dos processos judiciais e transações comerciais. À medida que avançamos, é crucial que os profissionais do direito continuem a se atualizar e a se adaptar a essas mudanças, garantindo a aplicação eficaz da lei na era digital.
Ricardo Alves é sócio responsável pela área de Tecnologia e Inovação do escritório Fragata e Antunes Advogados Fonte: Consultor Jurídico